Os capítulos 9 e 10 de 2º Reis narram uma das mais intensas sequências de acontecimentos na história do Reino do Norte de Israel.
Eles marcam o início da dinastia de Jeú, um homem escolhido por Deus para executar juízo sobre a casa de Acabe, culminando na destruição completa de uma linhagem marcada pela idolatria, corrupção e perseguição aos profetas do Senhor.
Esses capítulos são uma continuidade das profecias de Elias e mostram o zelo do Senhor em cumprir Sua palavra fielmente.
Neste artigo, analisaremos com profundidade os eventos descritos nesses capítulos, destacando os elementos históricos, teológicos e espirituais envolvidos.
A unção de Jeú, sua ação decisiva contra Jorão, Jezabel, Acazias e os descendentes de Acabe, bem como a erradicação do culto a Baal em Israel, revelam um momento singular de purificação nacional sob a direção divina.
Nosso objetivo é oferecer uma exposição clara, didática e rica em detalhes, baseada na Sagrada Escritura e sustentada por comentários bíblicos sólidos.
Este texto é destinado tanto aos estudiosos quanto aos leitores que desejam compreender mais profundamente a obra de Deus através da história de Jeú.
A unção de Jeú como rei de Israel
O capítulo 9 começa com a missão dada por Eliseu a um de seus discípulos: ungir Jeú como rei de Israel em Ramote-Gileade.
Este ato profético e secreto foi uma extensão da ordem que Deus dera anteriormente a Elias (1Rs 19:16), mostrando a continuidade do plano divino.
A unção foi realizada em um cenário reservado, sem testemunhas, evidenciando o caráter estratégico da operação.
O jovem profeta derramou o azeite sobre a cabeça de Jeú e proferiu a declaração divina: “Assim diz o Senhor: ungi-te rei sobre o povo do Senhor, sobre Israel” (2Rs 9:6).
Essa nomeação vinha acompanhada de uma comissão: destruir a casa de Acabe, vingando o sangue dos profetas mortos por Jezabel. A missão era clara: instaurar a justiça divina e purificar Israel da idolatria baalista.
Ao sair, o jovem profeta fugiu imediatamente, cumprindo a orientação de Eliseu (v.3). Jeú, então, foi questionado por seus companheiros sobre o encontro, e, após alguma hesitação, revelou que fora ungido rei. Seus colegas prontamente o reconheceram como tal, em um gesto simbólico de apoio, jogando seus mantos aos seus pés e gritando: “Jeú é rei!” (v.13).
O assassinato de Jorão e Acazias
Com a confirmação de sua realeza, Jeú rapidamente executou sua primeira ação: matar o rei Jorão.
Sabendo que Jorão estava em Jezreel se recuperando de ferimentos, Jeú partiu com urgência.
Sua chegada foi anunciada por um atalaia que reconheceu sua condução impetuosa, característica de Jeú (2Rs 9:20).
Ao encontrar Jorão no campo de Nabote, Jeú confrontou-o com a pergunta sobre paz, ao que respondeu que não poderia haver paz enquanto perdurassem as prostituições e feitiçarias de Jezabel (v.22).
Jorão tentou fugir, mas Jeú o matou com uma flecha certeira que atravessou seu coração. O corpo foi lançado no campo de Nabote, cumprindo a profecia de Elias (1Rs 21:19).
Acazias, rei de Judá e aliado de Jorão, também tentou escapar, mas foi ferido e posteriormente morto em Megido.
Sua associação com a casa de Acabe o condenou ao mesmo destino. A morte de ambos os reis foi o estopim do colapso da dinastia de Acabe e da influência de Judá no Reino do Norte.
O Fim de Jezabel
Ao chegar a Jezreel, Jeú encontrou Jezabel, a rainha mãe, que, ao saber da chegada do novo rei, tentou usar sua aparência e palavras sarcásticas para desestabilizá-lo.
Perguntou-lhe: “Teve paz, Zinri, que matou a seu senhor?” (2Rs 9:31), fazendo referência a outro usurpador. Porém, Jeú, sem se abalar, chamou por qualquer um que estivesse ao seu lado.
Dois ou três eunucos responderam ao seu chamado, e, sob sua ordem, lançaram Jezabel pela janela.
Seu corpo foi esmagado pelos cavalos e deixado no campo, onde mais tarde foi devorado por cães, restando apenas o crânio, os pés e as mãos (v.35). Isso cumpriu literalmente a profecia de Elias (1Rs 21:23).
Esse ato não foi apenas uma vingança, mas sim a execução de um juízo divino. Jezabel representava a corrupção moral e espiritual mais profunda de Israel, sendo a principal responsável pela introdução institucional do culto a Baal.
O extermínio da casa de Acabe
No capítulo 10, Jeú foca na eliminação sistemática dos descendentes de Acabe, iniciando por seus setenta filhos que estavam sob a tutela dos nobres em Samaria.
Jeú enviou cartas exigindo a entrega de um herdeiro para combate, mas os líderes, temendo Jeú, recusaram-se e se declararam servos dele (2Rs 10:5).
Em resposta, Jeú ordenou que fossem decapitados os filhos de Acabe e suas cabeças entregues em Jezreel. O ato brutal, mas eficaz, demonstrou a completa rendição da capital.
Jeú, ao ver os montes de cabeças, reafirmou a justiça de Deus ao dizer que aquilo era cumprimento da palavra do Senhor por meio de Elias (v.10).
Ele continuou a purgar, matando também os grandes, os aliados e sacerdotes de Acabe. Nada sobrou da influência da dinastia anterior. O zelo de Jeú, apesar de ser cruel, demonstrava a importância de restaurar a nação ao temor do Senhor.
A aliança com Jonadabe e a destruição dos adoradores de baal
No caminho para Samaria, Jeú encontrou Jonadabe, filho de Recabe, e o convidou para testemunhar sua dedicação ao Senhor.
Jonadabe era líder dos recabitas, um grupo devoto que rejeitava as práticas corrompidas do povo. Sua presença simbolizava apoio religioso e moral à missão de Jeú (2Rs 10:15).
Ao chegar a Samaria, Jeú preparou uma emboscada contra os adoradores de Baal.
Com astúcia, anunciou um grande sacrifício a Baal, atraindo todos os seus seguidores para o templo.
Garantiu que nenhum adorador do Senhor estivesse presente, separando o joio do trigo (v.23).
A emboscada foi bem-sucedida. Após o sacrifício, Jeú ordenou o massacre. Todos os adoradores foram mortos, as colunas queimadas e o templo destruído e transformado em latrinas.
Este evento simbolizou o fim oficial do culto a Baal em Israel, restabelecendo a autoridade do Senhor.
A avaliação final do reinado de Jeú
Apesar de seu zelo e de ter cumprido a vontade de Deus quanto ao juízo sobre Acabe e o culto a Baal, Jeú falhou em seguir plenamente a Lei do Senhor.
Ele manteve os bezerros de ouro instituídos por Jeroboão em Betel e Dã (2Rs 10:29), perpetuando a idolatria que dividia Israel espiritualmente.
Deus, contudo, reconheceu as boas obras de Jeú, prometendo-lhe que seus descendentes reinariam até a quarta geração (v.30).
Sua dinastia se estendeu por aproximadamente cem anos, a mais longa do Reino do Norte. Isso demonstra como Deus recompensa atos de obediência, mesmo em meio a falhas.
Nos últimos versículos, vemos que Jeú não se empenhou de todo coração no caminho do Senhor.
Como resultado, o Senhor começou a reduzir o território de Israel, permitindo que Hazael tomasse terras ao leste do Jordão. Jeú morreu após 28 anos de reinado, sendo sepultado em Samaria, e sucedido por Jeoacaz.
Conclusão
Os capítulos 9 e 10 de 2º Reis revelam como Deus age com soberania na história, levantando líderes como Jeú para executar Seus juízos.
A queda da casa de Acabe e a destruição do culto a Baal foram medidas drásticas, mas necessárias, para restaurar a santidade em Israel. O zelo de Jeú serviu como instrumento do Senhor para purificar a nação.
Entretanto, o relato também é um alerta sobre os perigos da obediência parcial. Jeú falhou em eliminar toda forma de idolatria e não caminhou com sinceridade diante de Deus.
Mesmo quando somos usados por Deus, precisamos manter a fidelidade completa, não apenas em ações pontuais, mas em todo o nosso viver.
Por fim, aprendemos que a justiça divina é imutável. As profecias dadas a Elias se cumpriram com precisão.
Isso nos encoraja a confiar no Senhor, sabendo que Ele vela por Sua palavra para a cumprir. A história de Jeú, com todos os seus contrastes, continua sendo um forte apelo à fidelidade e ao zelo pela glória de Deus em nossa geração.
Referências Bibliográficas
BÍBLIA. Português. Bíblia de Estudos Almeida. Tradução de João Ferreira de Almeida. 2ª edição, São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1999.
MacDonald, William. Comentário bíblico popular. Antigo Testamento. 1ª edição, São Paulo: Mundo Cristão, 2004.