Os capítulos 64, 65 e 66 do livro de Isaías representam a conclusão majestosa de uma das mais ricas obras proféticas do Antigo Testamento.
Aqui encontramos uma profunda oração de confissão, a resposta divina ao clamor do remanescente e vislumbres vívidos do juízo de Deus e da glória vindoura.
Esta seção final de Isaías não apenas encerra o livro, mas também ecoa temas centrais que percorrem toda a revelação bíblica: a santidade de Deus, a necessidade de arrependimento e a esperança de redenção.
No capítulo 64, o profeta expressa a angústia espiritual do povo, clamando para que Deus intervenha de maneira poderosa e visível.
Reconhece-se a gravidade do pecado nacional, a impureza espiritual e a necessidade urgente da misericórdia divina.
A oração retrata um povo consciente de que a restauração depende inteiramente da intervenção graciosa de Deus.
Nos capítulos 65 e 66, Deus responde. Há um contraste claro entre os rebeldes, que serão julgados, e o remanescente fiel, que herdará as promessas.
É revelado o plano divino para “novos céus e nova terra”, uma visão que aponta tanto para o reino milenar como para a consumação eterna.
Este texto é, ao mesmo tempo, um chamado à santidade, um aviso solene e uma promessa gloriosa para os que permanecem firmes no Senhor.
O clamor do povo e a confissão dos pecados (Isaías 64:1-12)
A oração de Isaías começa com um apelo: “Oh! Se fendesses os céus e descesses!” (Is 64:1).
O profeta pede que Deus manifeste Seu poder como no Sinai, quando a presença divina fez tremer montes e nações.
Este clamor revela a consciência de que somente a intervenção sobrenatural pode reverter a situação de decadência espiritual e moral de Israel.
O versículo 4 é notável: “Porque desde a antiguidade não se ouviu […] um Deus além de ti, que trabalha para aquele que nele espera.”
Aqui, Isaías exalta a singularidade de Deus, reconhecendo que Ele age em favor dos que o buscam.
Contudo, logo o tom muda para confissão: “Todos nós somos como o imundo […] e todas as nossas justiças, como trapo da imundícia” (v.6). Até os atos mais nobres do povo estavam manchados pelo pecado.
A metáfora do oleiro e do barro (v.8) sintetiza a esperança: apesar da ruína, Deus ainda é o Criador que pode moldar novamente Seu povo.
A oração termina descrevendo a desolação de Jerusalém e do templo, pedindo que o Senhor não permaneça em silêncio diante da calamidade.
Este clamor é exemplo de arrependimento sincero, que reconhece tanto a culpa quanto a soberania divina.
A resposta de Deus: o povo rebelde (Isaías 65:1-7)
Deus inicia Sua resposta com uma afirmação surpreendente: “Fui buscado pelos que não perguntavam por mim […] Eis-me aqui” (Is 65:1).
O texto mostra que, mesmo quando Israel O rejeitou, Deus Se revelou até a povos que não O procuravam.
O apóstolo Paulo aplicará esta passagem aos gentios (Rm 10:20), mas o contexto imediato ainda trata da rebeldia de Israel.
O Senhor descreve um povo “que anda por caminho que não é bom, seguindo os seus próprios pensamentos” (v.2).
A idolatria é detalhada: sacrifícios em jardins pagãos, necromancia, consumo de alimentos proibidos e uma atitude arrogante de “sou mais santo do que tu”. Essa falsa santidade é repulsiva a Deus, como fumaça constante em Suas narinas.
Por causa dessas práticas, Deus anuncia que retribuirá as iniquidades acumuladas, inclusive as dos antepassados (v.7).
O juízo não é impulsivo, mas justo e fundamentado na santidade divina. O quadro é claro: a resistência contínua à Palavra de Deus resulta em condenação inevitável.
O remanescente fiel e a promessa de restauração (Isaías 65:8-16)
Apesar do juízo sobre a nação, Deus preserva um remanescente fiel. Ele usa a imagem de um cacho de uvas que ainda contém suco — algo que não deve ser descartado.
“Assim farei por amor de meus servos e não os destruirei a todos” (v.8). Esta promessa revela o caráter misericordioso do Senhor, que sempre guarda um povo para Si.
A herança prometida é concreta: “Os meus eleitos herdarão a terra, e os meus servos habitarão nela” (v.9).
Locais como Sarom e o vale de Acor, antes associados à desolação, serão restaurados como lugares de descanso e provisão. É um retrato vívido da renovação que Deus opera para os que O buscam.
O contraste com os rebeldes é marcante (v.13-16): enquanto os servos de Deus comerão, beberão e se alegrarão, os desobedientes experimentarão fome, sede e vergonha.
Essa distinção reforça que a fidelidade a Deus não é apenas espiritual, mas também afeta o destino físico e eterno das pessoas.
Novos céus e nova terra (Isaías 65:17-25)
O Senhor anuncia: “Pois eis que eu crio novos céus e nova terra” (v.17). Aqui, Isaías apresenta uma realidade transformada, onde o passado doloroso não será mais lembrado.
Esta promessa aponta para o reino messiânico, embora seu cumprimento pleno ocorra na eternidade (Ap 21:1).
A nova Jerusalém será motivo de alegria tanto para Deus quanto para Seu povo (v.18-19). “O moço morrerá de cem anos” (v.20) — indicando longevidade e bênçãos sobre a terra.
A harmonia se estenderá à criação: lobo e cordeiro pastarão juntos, e até o leão comerá palha como o boi (v.25).
É um retrato poético e profético de um mundo pacificado sob o governo justo do Messias. Esta esperança serve de ânimo para o povo de Deus perseverar até a manifestação desta promessa.
O verdadeiro culto e o juízo dos ímpios (Isaías 66:1-17)
O capítulo 66 começa com uma declaração sobre a grandeza de Deus: “O céu é o meu trono, e a terra, o estrado dos meus pés” (v.1).
Isso desfaz qualquer ilusão de que Deus dependa de templos feitos por mãos humanas.
O Senhor olha para o “abatido e contrito de espírito e que treme da minha palavra” (v.2) — a verdadeira adoração é interior e sincera.
Deus denuncia o culto hipócrita (v.3-4), onde sacrifícios são feitos sem santidade, misturados a práticas idólatras.
O resultado é que o próprio Deus escolhe o castigo para esses falsos adoradores.
Em contraste, os que temem ao Senhor serão vindicados, mesmo que perseguidos por seus irmãos (v.5-6).
A linguagem profética sobre Sião “dando à luz” (v.7-9) antecipa tanto o nascimento do Messias quanto a restauração final de Israel.
É um lembrete de que nada pode frustrar os propósitos de Deus, e que Sua obra se cumpre no tempo exato determinado por Ele.
A glória final de Jerusalém e o juízo eterno (Isaías 66:18-24)
Deus anuncia que reunirá “todas as nações e línguas” para contemplar Sua glória (v.18).
Missionários do próprio Senhor levarão a mensagem até os confins da terra, e povos gentios ajudarão a trazer os israelitas de volta a Jerusalém como oferta santa (v.19-20). O sacerdócio e o serviço levítico serão restaurados.
A promessa se estende à eternidade: “Como os novos céus e a nova terra […] assim há de estar a vossa posteridade e o vosso nome” (v.22).
Haverá culto universal ao Senhor, de lua nova em lua nova, e de sábado a sábado (v.23). Jerusalém se tornará o centro espiritual do mundo.
O livro termina com uma cena solene: os fiéis verão o destino dos rebeldes, “porque o seu verme nunca morrerá, nem o seu fogo se apagará” (v.24).
Esta é uma das descrições mais vívidas da condenação eterna, servindo como alerta para todos os que rejeitam a graça de Deus.
Conclusão
Os capítulos finais de Isaías revelam o coração de Deus — justo no juízo, mas misericordioso na salvação.
Vemos que o pecado traz consequências inevitáveis, mas a fidelidade e a esperança no Senhor resultam em bênção eterna.
O remanescente fiel é sempre preservado, e as promessas de Deus se cumprem de forma gloriosa.
A visão de “novos céus e nova terra” não é apenas uma profecia distante, mas um convite presente para vivermos em santidade.
Assim como o oleiro molda o barro, Deus quer transformar nossa vida para que sejamos vasos de honra em Seu reino. Este é um chamado à rendição completa ao Seu senhorio.
Ao fechar o livro, somos lembrados de que o culto verdadeiro é aquele que nasce de um coração humilde e obediente.
Isaías nos convida a esperar com confiança o cumprimento das promessas divinas, certos de que a glória futura compensará qualquer sofrimento presente.
“Eis que faço novas todas as coisas” — esta é a certeza que sustenta o povo de Deus.
Referências Bibliográficas
BÍBLIA. Português. Bíblia de Estudos Almeida. Tradução de João Ferreira de Almeida. 2ª edição, São Paulo:Sociedade Bíblica do Brasil, 1999.
MacDonald, William. Comentário bíblico popular. Antigo Testamento. 1ª edição, São Paulo: Mundo Cristão, 2004.