Os capítulos 6 e 7 do primeiro livro de Reis apresentam um dos relatos mais significativos da história de Israel: a construção do Templo de Salomão, seguido pela edificação do palácio real e dos utensílios sagrados.
Este trecho é fundamental para compreendermos não apenas a grandiosidade arquitetônica do reinado de Salomão, mas também a centralidade da adoração no contexto da aliança com Deus.
A narrativa combina elementos técnicos, artísticos e espirituais que revelam o cuidado com os detalhes e a busca pela santidade.
O texto bíblico é rico em simbolismo e remete a uma teologia profunda: o Templo não é apenas uma construção física, mas representa a presença de Deus no meio do seu povo.
A promessa divina feita a Salomão, condicionada à obediência à Lei, reforça a importância da fidelidade à aliança mosaica.
A narrativa também contrasta o zelo pela Casa do Senhor com os interesses pessoais do rei, refletidos no tempo dedicado à construção do palácio real.
Para facilitar a compreensão e o estudo, este artigo inédito apresenta uma análise detalhada dos dois capítulos, dividindo-os em seis tópicos principais.
Cada tópico trata de aspectos específicos da construção, com três parágrafos explicativos, baseados nas Escrituras Sagradas e enriquecidos com comentários bíblicos e teológicos para uma leitura clara, precisa e edificante.
A construção do templo do SENHOR
A construção do Templo iniciou no quarto ano do reinado de Salomão, precisamente no mês de Zive (abril-maio), 480 anos após a saída dos filhos de Israel do Egito (1Rs 6:1).
Essa data não é apenas histórica, mas também simbólica, representando doze gerações de quarenta anos, conectando o Templo à jornada da nação israelita e à liderança espiritual de Moisés e Arão.
O Templo substituiu o Tabernáculo, mantendo a mesma estrutura básica, mas com dimensões maiores, medindo sessenta côvados de comprimento, vinte de largura e trinta de altura (1Rs 6:2).
A obra foi planejada com grande precisão. As pedras foram preparadas nas pedreiras, de modo que não se ouvisse barulho de ferramentas durante a construção (1Rs 6:7).
Isso reflete reverência e santidade, uma analogia espiritual à obra silenciosa que Deus realiza na vida de seus servos.
Três andares laterais foram construídos em torno do templo, com câmaras usadas para armazenar utensílios sagrados e para os sacerdotes (1Rs 6:5-10).
Deus aparece com uma palavra de advertência a Salomão (1Rs 6:11-13), destacando que Sua presença no Templo estaria condicionada à obediência à aliança.
Essa mensagem teológica é vital: o verdadeiro valor do Templo não estava em sua beleza ou riquezas, mas na fidelidade a Deus. Esse princípio ecoa no Novo Testamento, onde a Igreja é chamada a ser o templo do Espírito Santo (1Co 3:16).
O interior do templo e o Santo dos Santos
O interior do Templo foi inteiramente revestido com tábuas de cedro e ouro puro (1Rs 6:14-22).
Nada de pedra ficava exposto, simbolizando a perfeição da obra de Deus e a separação entre o sagrado e o comum.
A madeira era lavrada com entalhes de querubins, palmeiras e flores, refletindo o Jardim do Éden e a restauração da comunhão com Deus.
No fundo do Templo, o Santo dos Santos foi preparado como local para a Arca da Aliança (1Rs 6:19-20).
Esse espaço sagrado tinha forma de cubo, com vinte côvados de comprimento, largura e altura, e foi completamente coberto de ouro, inclusive o altar.
Ali, a presença de Deus se manifestava, e somente o sumo sacerdote podia entrar, uma vez por ano, para fazer expiação pelos pecados.
Dois grandes querubins de madeira de oliveira, também cobertos de ouro, foram colocados ali (1Rs 6:23-28).
Suas asas estendidas tocavam as paredes laterais e se encontravam ao centro, simbolizando proteção e a majestade divina.
Essa representação visual reforçava a santidade do lugar e o papel dos anjos como guardiões da presença de Deus.
Ornamentação e elementos arquitetônicos
As paredes internas e portas do Templo foram ricamente ornamentadas (1Rs 6:29-35).
As gravuras de querubins, palmeiras e flores abertas em madeira de oliveira, recobertas de ouro, não tinham apenas função estética, mas teológica.
Representavam a vida, a pureza e a proximidade com o Criador, trazendo à memória a beleza do Jardim original.
As portas que conduziam ao Santo dos Santos e ao Santo Lugar eram estruturadas de modo sólido e belo.
As de cipreste, quadradas, com dobradiças de ouro, e as ombreiras pentagonais demonstravam excelência e ordem.
Esse zelo nos detalhes apontava para a dignidade da adoração e a importância do culto a Deus.
O átrio interior, reservado aos sacerdotes, foi construído com três ordens de pedras cortadas e uma de vigas de cedro (1Rs 6:36).
Esse pátio proporcionava um espaço sagrado para as atividades litúrgicas, separando o comum do consagrado.
O Templo foi finalizado no mês de Bul, oitavo mês, após sete anos de construção (1Rs 6:38).
As construções reais de Salomão
O capítulo 7 inicia com a construção do palácio de Salomão, que levou treze anos para ser concluído (1Rs 7:1).
Isso contrasta com os sete anos dedicados ao Templo, sugerindo, conforme alguns comentários, uma possível inclinação ao luxo pessoal.
Por outro lado, pode indicar a prioridade do rei em concluir a Casa do SENHOR com mais agilidade e dedicação.
A Casa do Bosque do Líbano (1Rs 7:2-5) era uma das estruturas mais impressionantes.
Com colunas de cedro e três andares, funcionava provavelmente como arsenal e local de tesouros.
O Salão das Colunas e a Sala do Trono (ou Sala do Julgamento) demonstram a preocupação com a justiça e a administração real. Salomão também construiu uma casa para sua esposa, filha de Faraó (1Rs 7:8).
Todas essas edificações foram feitas com pedras de valor, cortadas com precisão, e rodeadas por um muro com pedras e vigas de cedro, refletindo o mesmo padrão de excelência aplicado ao Templo.
As colunas Jaquim e Boaz e o mar de bronze
Hirão, um artesão especializado de Tiro, foi convocado para confeccionar obras de bronze para o Templo (1Rs 7:13-14).
Entre suas principais obras estavam as colunas Jaquim (“Ele estabelecerá”) e Boaz (“Nele há força”) (1Rs 7:21).
Essas colunas, com dezoito côvados de altura, simbolizavam estabilidade e poder divino.
Cada coluna era encimada por capiteis com redes e romãs decorativas, totalizando quatrocentas romãs (1Rs 7:42). Essas frutas, à época, simbolizavam fertilidade e abundância espiritual.
O simbolismo das colunas permanece misterioso, mas aponta para a presença e a promissão de Deus no Templo.
Outra obra notável foi o Mar de Bronze (1Rs 7:23-26), uma enorme bacia sustentada por doze bois de bronze.
Servia para a purificação dos sacerdotes e representava o mar cósmico, fonte da vida.
Essa bacia comportava cerca de 44 mil litros de água, simbolizando limpeza, consagração e separação para o serviço sagrado.
Os utensílios sagrados e a dedicação
Hirão também confeccionou diversos utensílios de bronze: pias, caldeirões, bacias, suportes com rodas, todos usados nos rituais do Templo (1Rs 7:40-47).
Os dez suportes com pias menores facilitavam a lavagem dos instrumentos sacrificiais, destacando a importância da pureza ritual.
Salomão mandou fazer os utensílios do Santo Lugar: o altar de ouro, a mesa para os pães da proposição e os dez castiçais de ouro (1Rs 7:48-50).
Tudo foi feito com o mais puro ouro, inclusive as dobradiças das portas. Essa opulência demonstrava a honra e reverência devidas a Deus.
Ao final da obra, Salomão trouxe os tesouros que seu pai Davi havia consagrado ao Senhor (1Rs 7:51).
Estes foram colocados nos tesouros da Casa do SENHOR, demonstrando continuidade na adoração e fidelidade à aliança.
O Templo, assim, não era apenas uma realização de Salomão, mas um cumprimento de promessas geracionais.
Conclusão
Os capítulos 6 e 7 de 1º Reis revelam a profundidade espiritual, a organização técnica e o simbolismo teológico da construção do Templo e das construções reais.
A obra não era apenas de pedra e madeira, mas uma declaração viva de que Israel era o povo do Deus Altíssimo, e que o culto ao Senhor exigia santidade, ordem e excelência.
A figura de Salomão aparece como um rei-sumo sacerdote, que organiza tanto os aspectos espirituais quanto administrativos do reino.
Ao chamar Hirão, ele garante que a arte e a beleza também sejam parte do culto. Assim, o Templo aponta para a beleza da santidade e para a esperança de um Deus presente entre os homens.
Esse relato inspira a Igreja de hoje a reconhecer que, embora os tempos sejam outros, o princípio permanece: Deus deseja habitar em templos feitos de pedras vivas, santificados pela obediência e pela fé.
Que a construção do Templo de Salomão nos lembre do compromisso com a santidade e da glória do Senhor entre o seu povo.
Referências Bibliográficas
BÍBLIA. Português. Bíblia de Estudos Almeida. Tradução de João Ferreira de Almeida. 2ª edição, São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1999.
MacDonald, William. Comentário bíblico popular. Antigo Testamento. 1ª edição, São Paulo: Mundo Cristão, 2004.