Nos capítulos 35 a 38, encontramos um momento crucial na narrativa: a transição dos discursos humanos para a revelação divina.
Eliú, o mais jovem dos interlocutores, continua seu discurso, destacando a soberania de Deus e a insensatez do homem em questionar Seus caminhos.
Finalmente, o próprio Senhor fala com Jó, mudando completamente o rumo da conversa.
Esses capítulos apresentam uma rica fonte de reflexão teológica, com temas como a justiça divina, a inutilidade da arrogância humana e a beleza da criação como expressão da majestade de Deus.
Além disso, nos deparamos com um chamado à humildade diante da sabedoria divina, algo que muitos teólogos consideram um dos pontos altos do Antigo Testamento.
Neste artigo, faremos um resumo explicativo detalhado dos capítulos 35, 36, 37 e 38 de Jó, com linguagem acessível e teologicamente precisa.
Eliú repreende a autossuficiência de Jó (Jó 35)
O capítulo 35 marca a continuidade do discurso de Eliú, que critica a declaração de Jó de que sua justiça seria superior à de Deus.
Eliú afirma que tal pensamento é arrogante e revela uma falta de compreensão da natureza divina.
Ele argumenta que o pecado humano ou a justiça do homem não afetam a Deus diretamente (Jó 35:6-7), pois o Senhor é autoexistente e soberano.
Assim, Eliú introduz o conceito de que nossas ações têm mais impacto em outros seres humanos do que no Criador.
Eliú também chama atenção para o fato de que muitas pessoas clamam a Deus apenas por conveniência, sem buscar verdadeiramente Sua face (Jó 35:10-13).
Isso, segundo ele, é motivo pelo qual Deus não responde a certos clamores. Para Eliú, a falta de resposta divina não é sinal de injustiça, mas de julgamento sobre a hipocrisia humana.
A mensagem principal de Eliú neste capítulo é que o homem deve abandonar a presunção de merecer algo de Deus e, em vez disso, confiar em Sua sabedoria.
A advertência final a Jó é clara: “Abres a tua boca com palavras vãs, e multiplicas palavras sem conhecimento” (Jó 35:16). Aqui, vemos a base para a futura correção que virá diretamente do Senhor.
Deus usa o sofrimento como instrumento de ensino (Jó 36:1-21)
Eliú prossegue seu discurso destacando que Deus é justo e pedagógico, utilizando o sofrimento como meio de instrução.
Ele argumenta que Deus não despreza o justo, mas permite a aflição para despertar a consciência do pecado (Jó 36:10).
Assim, o sofrimento é interpretado como um recurso divino para a correção moral, e não como punição arbitrária.
O discurso de Eliú desafia a visão de que a dor é sempre resultado de uma maldição.
Pelo contrário, ele afirma que “ao aflito livra por meio da sua aflição” (Jó 36:15), indicando que a dor pode ser uma porta para o arrependimento e para uma vida mais próxima de Deus. O sofrimento, neste contexto, é visto como um canal de redenção.
Eliú ainda adverte Jó contra o perigo da rebeldia, alertando que insistir na própria justiça o colocaria no mesmo destino dos perversos.
A recomendação é clara: “Guarda-te, pois, de que a ira não te induza a escarnecer” (Jó 36:18). Essa exortação reforça a necessidade de humildade diante dos propósitos divinos.
A majestade de Deus na natureza (Jó 36:22-33)
Neste trecho, Eliú exalta a grandeza de Deus por meio das manifestações da natureza.
Ele apresenta o Criador como soberano sobre os elementos: chuva, trovão, relâmpagos e nuvens estão todos sob Seu comando (Jó 36:27-30).
Essas imagens não apenas revelam poder, mas também ensinam que há ordem e propósito mesmo nas tempestades.
A natureza, segundo Eliú, é um testemunho silencioso da glória divina. Quando os homens contemplam esses fenômenos, são levados a reconhecer que não compreendem totalmente o agir de Deus.
A imensidão do universo funciona como um lembrete de nossa limitação e da necessidade de reverência.
Ele conclui esse segmento ressaltando que até mesmo o juízo de Deus pode ser uma expressão de Sua graça, pois a tempestade, embora destrutiva, também irriga a terra e proporciona vida.
Aqui, a doutrina da providência divina se destaca: Deus governa todas as coisas com sabedoria incompreensível, mas sempre justa.
O poder divino revelado nas maravilhas da criação (Jó 37)
Eliú encerra seu discurso convocando Jó a contemplar as maravilhas da criação. Ele descreve os relâmpagos, a neve, a chuva e o frio como expressões do poder de Deus (Jó 37:5-10).
Essa observação não é meramente estética, mas teológica: a criação comunica verdades sobre o Criador.
Ele levanta questões retóricas destinadas a mostrar que o homem não compreende os caminhos de Deus.
Por exemplo, ele pergunta: “Tens tu notícia do equilíbrio das nuvens…?” (Jó 37:16). O objetivo é conduzir Jó à humildade, reconhecendo sua limitação diante da imensidão do universo.
A conclusão de Eliú é que “Deus é grande em poder, e não perverte o juízo” (Jó 37:23).
Com isso, ele encerra seu argumento destacando que o temor do Senhor é a resposta mais adequada diante de tamanha grandeza. Essa reverência, segundo ele, é o caminho da verdadeira sabedoria.
Deus fala com autoridade (Jó 38:1-3)
O capítulo 38 inaugura a esperada intervenção divina. Deus fala do meio de um redemoinho e confronta Jó com perguntas que revelam sua ignorância.
A primeira declaração é forte: “Quem é este que escurece os meus desígnios com palavras sem conhecimento?” (Jó 38:2).
Aqui, Deus desafia Jó a apresentar-se como homem diante de seu Criador.
Ao invés de explicar o motivo do sofrimento de Jó, Deus opta por expor a vastidão e complexidade da criação.
Isso sugere que, antes de questionar a justiça divina, o homem deveria reconhecer sua posição como criatura limitada e dependente.
Esse prólogo do discurso divino tem uma função teológica crucial: preparar o coração de Jó (e do leitor) para ouvir verdades profundas que transcendem a compreensão humana.
Deus se revela não apenas como Criador, mas como soberano absoluto.
As obras maravilhosas de Deus (Jó 38:4-41)
Nos versículos seguintes, Deus conduz Jó por uma série de questões sobre a criação. Ele pergunta: “Onde estavas tu, quando eu lançava os fundamentos da terra?” (Jó 38:4).
A sequência de perguntas serve para mostrar a vastidão do conhecimento divino em contraste com a ignorância humana.
Deus aborda várias áreas: astronomia, meteorologia, geologia e zoologia, mostrando que tudo está sob Seu controle.
Ele menciona as “cadeias do Sete-estrelo” e os “laços do Órion” (Jó 38:31), revelando Seu poder sobre os céus. É uma exposição poética e teológica da providência divina.
A última parte do capítulo foca na provisão de Deus para os animais, como os leões e os corvos (Jó 38:39-41).
Deus demonstra que cuida de cada criatura, do maior ao menor, reforçando a ideia de que Seu governo é detalhado, amoroso e justo.
Conclusão
Os capítulos 35 a 38 de Jó são uma jornada de desconstrução da soberba humana e de revelação da grandeza de Deus.
Eliú, ainda que com falhas, prepara o caminho para a aparição divina. Seu discurso revela verdades importantes sobre a pedagogia do sofrimento e a necessidade de humildade diante de Deus.
A resposta do Senhor às indagações de Jó não é uma explicação direta, mas um chamado à contemplação da majestade divina.
As perguntas de Deus são uma forma de revelar que o Criador está acima de todo questionamento humano. Ele não precisa justificar Seus caminhos, pois tudo que faz é justo.
Por fim, esses capítulos nos convidam a abandonar a arrogância espiritual e a confiar plenamente na soberania divina.
A verdadeira sabedoria não está em compreender tudo, mas em temer a Deus e reconhecer Sua glória em toda a criação.
Referências Bibliográficas
BÍBLIA. Português. Bíblia de Estudos Almeida. Tradução de João Ferreira de Almeida. 2ª edição, São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1999.
MacDonald, William. Comentário bíblico popular. Antigo Testamento. 1ª edição, São Paulo: Mundo Cristão, 2004.